Questões e respostas
Pai Nosso
É sempre de louvar a atitude de quem procura defender a dignidade e a beleza da liturgia da Igreja que peregrina por este mundo sob a orientação daqueles que Jesus colocou à frente da mesma como guias e pastores. Escutar, portanto, o Magistério da Igreja é o mesmo que escutar Jesus, o Bom Pastor. (Cf. Lc 10, 16). Não peregrinamos isolados; devemos caminhar em e com a Igreja. Às questões colocadas vou responder com recurso à Instrução Musicam Sacram (MS), documento que foi redigido pela Congregação do Culto Divino a pedido do Papa Paulo VI e pelo mesmo assinada só após doze revisões do texto. Vamos às questões.
1. Pode cantar-se o Pai nosso?
A Instrução MS diz o seguinte no nº 5: «A acção litúrgica reveste-se de maior nobreza quando é celebrada com canto: cada um dos ministros desempenha a sua função própria e o povo participa nela. (…) Os pastores de almas, portanto, hão-de esforçar-se por conseguir esta forma de celebração. (…)»
Continuando, diz no nº 7: «Entre a forma solene e mais plena das celebrações litúrgicas (…) e a forma mais simples (..) pode haver vários graus, conforme o canto tenha maior ou menor lugar. Todavia, na escolha das partes que se devem cantar, começar-se-á por aquelas que por sua natureza são de importância maior (…)». E o nº 28 da referida Instrução propõe três graus de participação «para que se torne mais fácil (…) melhorar a celebração da Missa por meio do canto». Entre os elementos que integram o primeiro grau estão: «as saudações do presidente com a as respostas do povo, (…) o prefácio com os respectivos diálogos e o Sanctus, a oração do Senhor – Pai nosso – (…). O segundo grau (inclui os cantos do Ordinário da Missa: glória, credo …) e terceiro grau (Cânticos de Entrada e Comunhão) nunca deveriam usar-se «senão unidos com o primeiro grau». As circunstâncias locais nem sempre permitem esta concretização.
Assim, podemos concluir que, quando há canto na celebração da Missa, o Pai nosso deveria ser sempre cantado.
2. Pode antepor-se ou acrescentar-se
um outro canto ao Pai nosso?
Respondo a partir do nº 35 da MS que nos mostra a seriedade com que deve ser tratado.
a) – «O Pai nosso, é bom que o diga o povo juntamente com o sacerdote. [Antes do Concílio era dito só pelo presidente; o povo intervinha apenas no final com a súplica “sed libera nos a malo, isto é, “mas livrai-nos do mal”]. Se for cantado em latim, empregam-se as melodias oficiais já existentes [actualmente, são 3]; mas, se for cantado em língua vernácula, as melodias devem ser aprovadas pela autoridade territorial competente [em Portugal, é a Conferência Episcopal]». O nosso Missal de Altar contém duas melodias oficiais: o Tom I e o Tom II, para distinguir os dias solenes de outros.
b) – Introduzir um outro canto antes do Pai nosso não parece atitude correcta. Para todos os cânticos usados em liturgia, é preciso ter em consideração a música e os textos. Por exemplo, dizer «Perdoa e destrói os reinos em que a corrupção é a lei mais forte (…)» será uma súplica cristã?! Atitude semelhante tiveram os apóstolos João e Tiago quando iam a caminho de Jerusalém. Perante a oposição dos samaritanos, disseram: «Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma? Mas Ele, voltando-se, repreendeu-os.» (Lc 9, 54). E depois, se logo a seguir se diz o «Pai nosso que estais nos céus… perdoai-nos as nossas ofensa assim como nós perdoamos…», como se liga uma coisa com a outra? Quando é que rezamos com sinceridade?
Além das dúvidas doutrinais ou da oportunidade do que se diz, cantando, não fica bem atribuir a Jesus o que Ele não disse. Sabe a aldrabice! Na verdade, o presidente da celebração introduz a oração com estas palavras (ou outras semelhantes): «Num só coração e numa só alma vamos rezar como o Senhor nos ensinou». Não consta que Ele tenha ensinado assim: “Pai nosso, em Ti cremos…” ou “Todo o mundo é um hino de glória…” ou “Pai nosso, dos pobres marginalizados…” ou “… ???” Não, não consta! Ele recomendou antes: «Nas vossas orações não sejais como os gentios, que usam de vãs repetições, porque pensam que por muito falarem, serão atendidos. Não façais como eles (…). Rezai, pois, assim: Pai nosso que estais nos céus …» (Mt 6, 7-13). E está tudo dito.
c) – Consideremos também o motivo desta “inovação”. Para ser diferente? Para dar mais solenidade? Para mostrar que somos criativos? Para … ?!
Repare. Já se iniciou o “Rito da Comunhão”. Além de alongar demasiada e aparatosamente aquele momento, parece que mais perturba que favorece a atitude interior dos fiéis: distrai do essencial. Assim, nas acções litúrgicas, o canto a que se refere a consulta não é aceitável; em outras ocasiões… (desde que não haja erros doutrinais), viva a santa liberdade dos filhos de Deus.
Em resumo: em tudo e com simplicidade devemos procurar e seguir a verdade que o Senhor nos propôs.
3. E se o presidente da celebração
admitir esta [ou outra] inovação?
Comemorámos, em 11 de Outubro de 2012, o 50º aniversário da abertura do II Concílio do Vaticano. Foi um Concílio eminentemente pastoral. Um dos temas tratados foi a Sagrada Liturgia. A propósito da reforma da mesma lê-se no nº 22 da Constituição Sacrosanctum Concilium: «A regulamentação da sagrada liturgia depende unicamente da autoridade da Igreja, a qual reside na Sé Apostólica e, segundo as normas do Direito, no Bispo.
Por isso, em matéria litúrgica, absolutamente mais ninguém, mesmo que seja sacerdote, acrescente, tire ou mude coisa alguma por iniciativa própria».
Isto é o que está determinado. A Igreja é o povo de Deus, livre, mas não sem lei, peregrino a caminho da pátria definitiva. Como membros deste povo devemos procurar caminhar juntos, em união com o Papa e o nosso Bispo, mantendo e defendendo a unidade entre todos, segundo a vontade do Senhor. «Pai, que todos sejam um …» (Jo 17, 20-23).
Foi esta a minha reflexão a propósito da consulta feita. Se quiser aprofundar mais os temas relacionados com a Liturgia e Música Sacra, poderá recorrer a obras publicadas pelo Secretariado Nacional de Liturgia, tais como:
– A Beleza da Liturgia (colectânea recente de perguntas e respostas)
– A Instrução Geral do Missal Romano
– A Música Sacra nos Documentos da Igreja (Legislação produzida pelo Magistério da Igreja ao longo de todo o séc. XX)
Um colaborador do SNL