Questões e respostas

Procissões com o santo lenho

Na minha paróquia sempre se levou o "Santo Lenho" debaixo do pálio nas festas em honra dos santos, padroeiros ou não. Desde há um ano, com a entrada de um novo pároco, este não quer levar o santo lenho, porque diz que não entende a razão de o fazer, e que o pálio só se usa para levar o Santíssimo Sacramento. Ora, estive a pesquisar e encontrei muita informação no sentido de que não só se deve levar o santo lenho nas procissões de festas, mas também o pálio por cima do santo lenho. Gostaria que me dessem informação fundamentada nas normas litúrgicas ou na tradição da Igreja, se possível indicando-me os documentos.

 

Caro consulente, resumo a resposta dada, há tempos atrás, a outra pergunta semelhante à sua: «A expressão "santo lenho" refere-se a uma relíquia da Cruz e equivale à expressão "madeiro da cruz". Nos livros litúrgicos actuais o termo vem referido no Missal Romano, no Cerimonial dos Bispos e na Liturgia das Horas. Existem, espalhados pelas paróquias, muitos santos lenhos. É célebre aquele que se encontra no museu da Catedral de Évora. O Cerimonial dos Bispos diz: "Nas procissões do Santíssimo Sacramento, lenho da Santa Cruz..., quando o Bispo participar na procissão, convém seja ele próprio... a presidir à procissão, levando ele mesmo o Santíssimo Sacramento ou o objecto sagrado" (CB 1100). Já fui responsável de uma paróquia onde, na procissão do Senhor dos Passos, é levada, debaixo do pálio, uma relíquia do santo lenho, com a qual, no fim da procissão, se dá a bênção ao povo».
Depois desta síntese, respondo agora directamente à sua pergunta. Começa por referir o costume de, na sua paróquia, sempre se ter levado o santo lenho debaixo do pálio, nas festas em honra dos santos. Recordo que a palavra "pálio" tem dois significados: a) é uma insígnia pontifical usada sobretudo pelos arcebispos, mas não só, constituída por uma tira de lã branca, com seis cruzes; b) é uma espécie de dossel de seda, sustentada por varas, sob o qual vai o Santíssimo Sacramento, o santo lenho, etc. (dizem os dicionários). É neste segundo sentido que a tomo aqui. O novo Cerimonial dos Bispos utiliza-a uma só vez e numa única situação: «Usar-se-á o pálio, sob o qual vai o Bispo com o Santíssimo Sacra­mento, conforme os costumes locais» (CB, n. 391). Permito-me chamar a sua atenção para esta divergência entre dicionários e novo Cerimonial dos Bispos.
O antigo Cerimonial era muito mais meticuloso na utilização do termo "pálio", como pode deduzir-se destas distinções citadas no Curso de Liturgia Romana, de D. António Coelho, O.S.B. (Tomo I, n. 699): «1. O pálio é obrigatório nas procissões em que é levado o Santíssimo Sacramento.... 2. É tolerado para as relíquias da verdadeira Cruz.... 3. É proibido empregar o pálio para cobrir relíquias ou imagens dos santos ou de Nossa Senhora.
Como vê, a utilização do pálio, como se fazia na sua paróquia, era um uso tolerado, à luz da terminologia anterior à última reforma litúrgica. Actualmente, penso que poderia continuar a fazer-se assim, "conforme os costumes locais", mas é verdade que o novo Cerimonial dos Bispos é omisso a tal respeito, falando apenas da obrigatoriedade de usar o pálio nas procissões do Santíssimo Sacramento, como aliás me diz ser a posição do seu novo pároco.
Com estes esclarecimentos certamente ficará mais capaz de interpretar correctamente aquilo que, pelos vistos, passou a fazer-se na sua terra, "desde há um ano". Não faço aqui um juízo de valor; limito-me a dar-lhe elementos para a sua própria reflexão, embora pense que os costumes litúrgicos ligados à piedade popular nos devem merecer a todos muito respeito, pois nem nasceram ontem, nem se impuseram contra a vontade da maioria dos cristãos de determinada comunidade.
Afirma por fim na sua pergunta: «Estive a pesquisar e encontrei muita informação no sentido de que não só se deve levar o santo lenho nas procissões de festas, mas também o pálio por cima do santo lenho. Gostaria que me dessem informação fundamentada nas normas litúrgicas ou na tradição da Igreja, se possível indicando-me os documentos». Faço dois comentários a estas suas palavras: nem todas as pesquisas sobre assuntos litúrgicos nos dão a garantia de termos obtido informações correctas, pelo que haverá sempre necessidade de as fundamentar por outras vias. Foi precisamente isso que procurei fazer na resposta que acabo de lhe dar.
Fez-me ainda outra pergunta. Peço desculpa de não lhe responder, pois se o fizesse as minhas explicações tornar-se-iam muito extensas.


um colaborador do SNL