Questões e respostas

A toalha do altar

A toalha do altar da minha igreja paroquial começou por ser deixada de lado, e neste momento não existe mais toalha em cima do altar. Em vez dela está a ser usado apenas o corporal, na hora da consagração. Responda-me, por favor, se isto está de acordo com a Instrução Geral do Missal Romano.

 

Li, com atenção, o que nos escreveu no seu e-mail, e entendo que, à imitação de Jesus, não nos fica mal desabafar como Ele próprio fazia, pois somos seus discípulos. Não é mal nenhum procurar compreensão, apoio e esclarecimento junto de quem no-los possa dar, e pedir-lhes, até, que nos ajudem a ultrapassar determinadas dificuldades que vão surgindo na vida litúrgica paroquial. Graças a Deus está ciente de que em todo o lugar existe este tipo de problemas e que, portanto, não é a única a sentir-se mal com decisões tomadas por alguns responsáveis de comunidades cristãs.
Fez bem em não me dizer o nome da sua diocese nem da sua paróquia. Assim ficamos ambos mais à vontade.

Começo por louvar a dedicação de sua mãe e das duas filhas, uma das quais é você própria, no arranjo do altar da sua igreja paroquial, durante quase vinte anos, e sublinho o que diz na sua carta: para nós não se tratava de um trabalho, mas de uma graça de Deus.

A nossa responsabilidade, diz no seu e-mail, estendia-se às flores, às alfaias (cálice e patena) e às velas, que minha irmã fazia. Belo exemplo de colaboração de uma família em favor da mesma causa. Felizes as paróquias onde isso continua a acontecer. Conheço outros casos, semelhantes ao seu, pelo meu país fora, igualmente reveladores de grande generosidade por parte de muitas jovens, para com as suas igrejas. No fim de uma semana de trabalho intenso e duro no campo, é com alegria e generosidade que passam duas ou mais horas na igreja paroquial a varrer, a lavar e a adornar com flores, para que o espaço litúrgico esteja o mais acolhedor possível na Missa do domingo, o dia do Senhor e da comunidade que se reúne em seu nome.

Alegro-me com o facto de o Senhor ter suscitado em vós o gosto e o amor pelas coisas sagradas, principalmente o altar, que passou a fazer parte da vossa vida, com mais clareza e entendimento do que acontecia antes. É caso para dizer, usa e serás mestre. As coisas da fé entendem-se melhor quando se fazem com amor, dedicação e persistência.

Pelo tom de sinceridade que se adivinha na sua carta, não me causa admiração que se sinta preocupadíssima com o que vem acontecendo na sua cidade. Não é para menos: depois de retirarem todos os crucifixos das igrejas e as imagens (dos santos), o altar de granito foi substituído por outro e jogado no meio dos destroços da construção, como se fosse uma mesa qualquer. Pobre altar, que tantas vezes foi mesa do sacrifício de Cristo e símbolo da mesa da última Ceia, ser tratado com tanto desamor! O que vale é que ele não pensa nem sente. Mas pensamos e sentimos nós, e por isso nos dói.
Diz-nos ainda que, na sua paróquia, situada na cidade onde tudo isto acontece, continua a haver uma toalha, que raramente é mudada. Mas todas as outras desapareceram: a vermelha, a verde, as outras brancas, de renda, bordadas, pintadas, etc.
Não admira que a sua descrição pormenorizada termine com um apelo: Socorra-me, por favor, pois está a tornar-se difícil manter a liturgia equilibrada e sóbria.

Se até aqui deixei que falasse o seu coração desapontado com tantas arbitrariedades, a partir de agora darei sobretudo voz aos documentos litúrgicos da Igreja, por estar convencido de que todos precisamos de frequentar a sua leitura serena e atenta, e à minha própria reflexão, sempre fundamentada nesses documentos.
Foi bom, para nossa informação, ter-nos dito tudo o que disse. Mas como nos pede esclarecimento apenas quanto às toalhas do altar, limitar-nos-emos a esse ponto, embora a sua carta merecesse outros comentários.

Antes de mais quero dizer-lhe, cara consulente, que não está "atrasada" nos seus conceitos de liturgia, pois caminha ao passo do espírito e da letra da Instrução Geral do Missal Romano, onde pode encontrar este texto: «Pela reverência devida à celebração do memorial do Senhor e ao banquete em que é distribuído o Corpo e o Sangue de Cristo, o altar sobre o qual se celebra deve ser coberto ao menos com uma toalha de cor branca, que, pela sua forma, tamanho e ornato, deve estar em harmonia com a estrutura do altar» (IGMR 304). Quer isto dizer que, durante a celebração da Missa, a toalha do altar não é facultativa, mas obrigatória, pela reverência devida à celebração do memorial do sacrifício do Senhor e à distribuição da comunhão do seu Corpo e Sangue. Mas isto é na celebração.

E fora da celebração? Directamente, o texto refere-se apenas à celebração, e não ao tempo que a antecede ou a segue, razão pela qual, segundo alguns liturgistas, fora da celebração o altar deveria estar sem toalha. «Só no momento da eucaristia o altar deve apresentar o aspecto de uma mesa preparada para o convívio. As toalhas, sobretudo, fazem com que a mesa do Senhor adquira este carácter. É certo que se torna muito mais cómodo deixar as toalhas postas durante todo o dia… Sabemos que nas origens a toalha só se colocava para a celebração eucarística. E, pelo menos em alguns lugares, no século XVIII ainda estava vigente este uso. Por outro lado, fora da celebração eucarística, as toalhas cobriam-se com algum pano e assim se tornavam menos visíveis… A colocação das toalhas relaciona-se com o banquete que se celebra no altar. E este banquete só tem lugar quando se celebra a eucaristia… Portanto, na prática, no momento da celebração eucarística deve colocar-se uma grande toalha, festiva… Mas, terminada a celebração da eucaristia, esta toalha deveria retirar-se sempre» (Pedro Farnés Scherer, Construir y adaptar las iglesias).
Apesar de o autor deste texto terminar com um deveria condicional e não com um deve absoluto, devo dizer que, para mim, as coisas não são assim tão claras e vou explicar porquê. Os únicos lugares onde o Missal diz que o altar deve ficar despido, é nos dias do Tríduo Sagrado: Quinta-Feira Santa, Sexta-Feira Santa e Sábado Santo.
Assim, terminada a Missa de Quinta-Feira Santa, o Missal diz: «Segue-se a desnudação do altar» [Missal Romano, Edição de Altar (Portugal), p. 250, n. 19]. Ao começar a celebração de Sexta-Feira Santa, diz-se: «O altar deve estar totalmente despido: sem cruz, sem candelabros, sem toalhas» (l.c., p. 251, n. 2); à adoração da cruz, nesse mesmo dia, segue-se a Sagrada Comunhão, a propósito da qual diz a respectiva rubrica: «Estende-se uma toalha sobre o altar e colocam-se nele o corporal e o Missal» (l.c., p. 278, n. 21); no final da celebração acrescenta-se: «Todos se retiram em silêncio e, em tempo oportuno, desnuda-se o altar» (l.c., p. 280, n. 28). No Sábado Santo, a única rubrica desse dia diz: «… A Igreja abstém-se do sacrifício da Missa (a mesa sagrada continua despida) até ao momento em que, depois da solene Vigília ou expectativa nocturna da ressurreição, se dará lugar à alegria pascal…» (l.c., p. 280).

Porquê todas estas indicações (cinco ao todo) acerca da desnudação do altar ou do seu revestimento, em tão poucas páginas, quando, no resto do Missal, nada de semelhante se diz? Apenas e só por estarmos no Tríduo Sagrado. É tal a solenidade desses três dias únicos, que justificam plenamente esse modo de falar.

Os liturgistas sabem, aliás, que as celebrações desses dias, incluindo a da Vigília Pascal, que faz parte do Tríduo, sempre foram tratadas com o máximo respeito por todas as reformas litúrgicas. Para quê? Para as deixar o mais possível iguais ao seu esquema primitivo. Se, na Missa da Ceia do Senhor, em Quinta-Feira Santa, não se diz o Credo, como se lê na rubrica do Missal, (p. 247), é porque o Credo foi introduzido tardiamente na Missa; se, na Celebração da Paixão do Senhor, em Sexta-Feira Santa, sempre se disse a solene Oração Universal, quando esta já desaparecera de todos os outros dias do ano, é porque assim se fazia em todas as Missas na Igreja dos primeiros séculos. Se, na Sexta-Feira Santa e no Sábado Santo não se celebra Missa, é porque se trata de uma tradição antiquíssima, como se pode ler na primeira rubrica de Sexta-Feira Santa: «Hoje e amanhã, segundo uma tradição antiquíssima, a Igreja não celebra a Eucaristia». Os dias em que não se celebra a Eucaristia chama-se dias alitúrgicos.

As indicações do Missal, durante o Tríduo Sagrado, relativamente à toalha do altar, recordam-nos que era assim que se fazia em todas as celebrações, nos tempos mais recuados da Igreja. Mas o silêncio do mesmo Missal, em todos os outros dias do ano, não estará a dizer-nos que o altar deve estar permanentemente coberto ao menos com uma toalha?
É verdade que, em parte nenhuma, se utiliza o advérbio permanentemente ou sempre. Mas também é certo que, em parte nenhuma, excepto nos dias do Tríduo Sagrado, se afirma que, terminada a Missa, a toalha deve ser tirada do altar.

É isto o que deduzo do conjunto de textos que citei. Se alguém tiver outros que invalidem, de forma clara, o que acabei de lhe dizer, mudarei de opinião. Até lá, fico com a minha, pois a vejo, de algum modo, confirmada nestas palavras genéricas da Instrução Geral: «O altar deve ser coberto pelo menos com uma toalha de cor branca» (IGMR 117). Como não se diz quando, deduzo que é sempre. Refiro-me, como é evidente, ao altar principal da igreja, e não aos altares laterais, que têm outro estatuto. Torno extensivo o uso permanente da toalha ao altar da capela do Santíssimo Sacramento, por razões óbvias.

Penso, além disso, que é utópico, na maior parte dos casos, pretender que a tolha seja retirada do altar após cada Missa. Quem o faria? Quem voltaria a colocá-la se, passada uma hora, voltasse a celebrar-se no mesmo altar?

Devemos ser realistas e entender, com o Missal Romano, que o desnudamento do altar só se justifica plenamente no Tríduo Sagrado, por razões simbólicas.

E não se argumento, tão pouco, com o que se faz nas nossas famílias, onde a mesa é posta e levantada para cada refeição. É que, na família, há muito quem ajude, o que nem sempre acontece nas nossas igrejas paroquiais.

Quanto ao facto de, na sua paróquia, se usar apenas o corporal sobre a pedra do altar, não é assim que se exprime a Instrução Geral: «A celebração da Eucaristia em lugar sagrado faz-se sobre o altar; fora do lugar sagrado, também pode ser celebrada sobre uma mesa adequada, coberta sempre com uma toalha e o corporal, e com a cruz e os candelabros» (IGMR 297). Qualquer altar ou qualquer mesa que sirva de altar deverão sempre ser cobertos com uma toalha e o corporal.
Tenho consciência de ter sido demasiado extenso na resposta à sua pergunta muito simples. Para a próxima, se houver próxima, tentarei ser mais breve.


Um colaborador do SNL